sexta-feira, 13 de junho de 2014

História de Tereza

       Tereza estava deitada em seu quarto, pensando no que poderia fazer para ocupar seu tempo livre. Essa vida de dondoca não é nada fácil! Já tinha feito lindos bordados, já arrumara e enrolara os belos cabelos louros, já dobrara delicadamente seus lenços brancos de moça casta e também já havia feito seu costumeiro passeio a cavalo. No entanto, ainda eram três horas da tarde de terça feira. Tereza gostava de ficar trancada em seu quarto sonhando com o dia em que poderá ser livre. Não que ela não viva feliz na fazenda de seu pai, o reverenciado Coronel Adail Custódio, mas essa não era a vida que ela tanto almejava viver. Capricho de moça mimada? Talvez. Só sei dizer que Tereza tinha vontade de sair, usar vestidos menos compridos, fazer um penteado diferente ou até quem sabe colorir os cabelos. Morria de inveja quando ouvia falar de sua prima Dalila. Dalila era livre, do jeito que ela queria e merecia ser. Dalila tinha cabelos curtos, os quais já havia trocado de cor umas três vezes. Além disso, foi a primeira mulher da cidade de Belmont a usar calças compridas, iguais as dos homens. Todos criticavam os costumes de Dalila, menos Tereza, que se sentia cheia de coragem quando desabafava com a prima sobre sua vida tediosa e ouvia seus conselhos de moça da cidade. No entanto, Tereza logo desanimava quando olhava para o semblante sério do pai, sempre capaz de qualquer coisa para defender a honra da família. Ainda mais ela, que era a única filha moça e caçula, sendo os outros dois irmãos homens valentes e mais velhos. Tereza simplesmente se via sem esperança. Vivia a espera de um pretendente com quem pudesse casar e ir para a cidade, mas até agora nada! Mas, para falar a verdade, não era bem isso que Tereza queria, ela queria mesmo era ser livre. Tomou ''O primo Basílio'' nas mãos e começou a ler, afinal, isso era a sua única distração contra as horas que pareciam se arrastar, principalmente nos dias sem sol.
       Como tudo na vida passa, a longa terça feira de Tereza também passou e se foi no meio de tantas outras terças feiras tediosas que tivera em seus dezoito anos de vida. Sábado chegou e por coincidência, era véspera de natal. Tereza até tinha se esquecido disso, os dias para ela eram quase sempre iguais, só tinha percebido a diferença quando notou a correria de sua mãe ordenando as criadas para matar tal boi, tal porco, tal peru, fazer tal doce, tal arroz etc. Tereza até gostava um pouco de natal, principalmente quando se lembrou que Dalila viria junto com seus outros primos e seus tios. Mas dentre tantas pessoas, Tereza só se importava em conversar com Dalila.
       A noite chegou, todos os parentes e convidados já haviam chegado também. A ceia ocorreu como sempre: sua mãe falando para suas tias o quanto é difícil controlar aquela casa, pois não se fazem mais criados como antigamente. Seu pai exibindo sua valentia para os outros homens da família que pouca diferença tinham dele. Para Tereza eram todos homens barbudos, fedidos e estúpidos, por isso sempre dizia para si mesma que pensaria bem antes de casar, a não ser que fosse obrigada a casar com alguém igual a eles e sabia que esse seria o acontecimento mais provável se continuasse aceitando aquela vida. Tereza sabia que sua mãe não era feliz. Foi casada pelo pai, que escolheu o noivo. Ela dizia que com o tempo aprendeu a amar o Coronel, mas Tereza sabia que bem lá no fundinho ela gostaria de ter escolhido outro marido. Enfim, Tereza estava farta de ver mulheres infelizes, farta de não ter liberdade, de não ter o que fazer, de não poder ajudar as criadas, pois ''filha de coronel não nasceu para essas coisas'', farta de sua vida sem graça, monótona e vigiada pelos irmãos que não permitiam que ela fosse a cidade sem a companhia de um deles.
     Subitamente, Tereza sentiu um enjoo no mais profundo de sua alma aflita, levantou-se da mesa, no final da ceia e correu para o seu quarto cheia de vontade de chorar. Todos pararam para observar a atitude. Sua mãe interviu:
__ Não liguem muito para Tereza! Essa menina leva uma vida de rainha, mas parece nunca estar satisfeita. De uns dias para cá anda muito estranha, quase não conversa, parece que tem algum plano secreto e está com medo que alguém descubra.
     Tia Benta, mãe de Dalila disse:
__ Por que vocês não mandam Tereza para passar uns dias em nossa casa? Adoraríamos tê-la conosco, além de ser muito amiga de Dalila. Assim as duas se entendem e quem sabe ela não arruma um bom partido por lá e volta mais animada para a casa.
     O Coronel, que já estava quase rangendo os dentes por causa da conversa, disse em alto e em bom som:
__ Não é porque a filha da senhora é uma perdida que a minha deve ser também. Filha minha não passa dias na casa de parente nenhum, menos ainda na companhia de sua filha que tem se comportado como uma legítima mulher da vida!
__ Olhe lá como o senhor fala Coronel! Minha filha é independente. Tem só vinte e um anos e já é dona do maior salão de beleza de Belmont. Minha filha sabe o que é viver.
     Felizmente, Dalila não estava mais a mesa para ouvir a insensata conversa a seu respeito, tinha saído logo depois de Tereza, para o mesmo lugar que a mesma, para tentar consola-lá.
    As duas estavam no quarto, Tereza gritou:
__ Por favor, Dalila, me ajude! Eu quero sumir dessa gente, eu quero viver, tenho sede de liberdade. Não suporto mais essa vida medíocre. Eu queria ter a sua coragem. Você é feliz porque nunca conheceu seu pai e sua mãe sempre te ajudou a crescer na vida, já eu sou uma miserável fadada ao tédio e ao casamento forçado. Por favor, me ajude, me dê uma ideia.
__ Se acalme Tereza, vamos pensar em alguma coisa para você sair daqui. Eu sei que seu pai nunca te deixará ir morar em Belmont comigo, então temos que arrumar outra solução.
__ Mas qual, minha querida prima? Qual? __ Gritava Teresa com a voz entrecortada pelas lágrimas que jorravam violentamente de seus olhos azuis.
__ Tereza, arrume algumas roupas, mas não muita coisa que amanhã quando seu pai e seus irmãos tiverem saído e sua mãe tiver no rio supervisionando as criadas a lavar roupa, mandarei um amigo meu te buscar de carro. O nome dele é Angelo, você vai adorar. É um rapaz alto, bonito e muito engraçado.
__ E se alguém me ver na estrada ou me reconhecer na cidade? E se alguma criada ou minha mãe ouvir o barulho do carro? O que farei Dalila? Não vejo solução cabível para a minha vida.
__ Faça como falei. Espere até que todos estejam longe e ocupados. Arrume suas coisas e espere no meio do canavial. Ninguém anda por lá! Você sabe disso. Mas tenha coragem, não pule para trás, estou querendo te ajudar, pois é minha melhor amiga e prima.
__ Eu sei Dalila. Mas para onde irei quando vier me buscar?
__Deixarei que fique escondida na fazenda de Angelo. É bem longe daqui... E quando as coisas acalmarem e todos tiverem esquecido de seu desaparecimento, aí você será maior de idade e poderá viver livre, assim como eu.
__ Muito obrigada minha prima, não sei o que faria se não fosse você! Terei coragem e farei o impossível para ter felicidade nessa vida.
__ Vai valer a pena, querida Tereza. Acredite nisso.
    As duas se abraçaram. A ceia passou, todos foram embora, Tereza dormiu.
    No dia seguinte, conforme o combinado, aguardou ansiosamente até que todos os moradores da casa estivessem ocupados. Colocou algumas mudas de roupa e fez uma trouxa. Cobriu a cabeça com um pano negro, por segurança, caso alguém a visse de longe. Mas felizmente ninguém apareceu. Tereza foi para o meio do canavial e ficou surpresa ao ver que o carro de Angelo já estava ali.
     Angelo, era ainda mais bonito do que Dalila havia descrito. Tinha uma rosa entre os dedos. Cumprimentou-a sorrindo com belos dentes brancos:
__ Bom dia, a senhorita deve ser Tereza. Vim a pedido de Dalila e trouxe essa rosa para cumprimentá-la. A senhorita é bem mais bela do que Dalila me descreveu. Mas ande, vamos, entre no carro que no caminho conversaremos mais.
__ Obrigada. Você deve ser Angelo. Fico grata em conhecê-lo.
      Foram as palavras de Tereza enquanto estava entrando no carro, sentindo suas faces queimarem por estar a sós com um homem que não fosse seu pai ou um de seus irmãos.
    O carro foi seguindo e Tereza sempre calada. As vezes Angelo lhe perguntava algo, mas sempre com o maior respeito e gentileza, de um jeito que ela nunca vira seu pai falar com sua mãe.
    Foi um pouco mais de uma hora para chegar a fazenda que Angelo morava. Ao chegar, percebeu que Dalila já estava a esperando na porteira. Recebeu-a com um abraço apertado e mil elogios pela coragem e confiança. Tereza entrou  e foi bem recebida pelos pais e pela irmã de Angelo. Aquela gente parecia conhece-la há anos. Dona Joana e seu Alceu, pais de Angelo, mostraram seu quarto e ajudaram-na a arrumar suas coisas juntamente com Dalila. Tereza se sentia em casa!
    Por um momento ficou nervosa ao pensar que estava indo morar na casa de um homem, mas toda a gentileza da família acalmou sua timidez. Dalila foi embora cuidar de seu salão, dizendo que todos os dias viria visitá-la. E realmente cumpriu sua promessa.
     Doze anos se passaram desde aquele dia. Tereza e Angelo se casaram naquele mesmo ano. Hoje Tereza é mãe de Maria Cecília, nome que é de sua mãe. Maria Cecília passa a maior parte do tempo no salão, junto com Dalila. Tereza, hoje, tem os cabelos curtos e negros e o vestido quase não procura mais, prefere as calças compridas, principalmente quando esta ajudando Dalila a lavar os cabelos das clientes. Os pais de Tereza a veem de vez em quando, mas nunca falaram nada sobre a fuga, apenas cumprimentam e perguntam da vida, do marido e da filha.
    Hoje, Tereza é a mulher mais feliz do mundo!
Por: Miriã Pinheiro



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